Quando terminei Nós Somos a Cidade, o primeiro volume da duologia Grandes Cidades, eu estava em puro êxtase literário. Aquele livro foi um dos meus favoritos da vida — uma mistura ousada de urban fantasy, crítica social e magia cósmica que me deixou obcecada pelo universo que a Jemisin criou. E quando chegou Nós Fazemos o Mundo, publicado no Brasil em 2023 pela Editora Suma, minhas expectativas estavam lá no topo do Empire State.
Mas aí veio a leitura. E apesar de ser um bom livro, com ideias brilhantes e personagens que ainda me emocionam, algo ficou corrido demais. Parecia que Jemisin, essa autora que eu amo tanto que compro tudo que sai no Brasil, estava tentando dar conta de encerrar a história com pressa. E sim, no final do livro ela explica um pouco do porquê. Ainda assim... fiquei com aquele gostinho de queria mais. 🥺
Título Original: The World We Make - Great Cities #2
🗽 Nós Fazemos o Mundo – N.K. Jemisin
📖 Duologia Grandes Cidades – Livro 2
🌍 Um universo apaixonante que correu contra o tempo... e perdeu um pouco do fôlego no sprint final.
A trama continua exatamente de onde o primeiro volume parou: as cidades vivas de Nova York, cada uma com seu avatar, ainda enfrentam a invasão de uma entidade extradimensional que quer apagar sua existência. Mas dessa vez, a batalha ganha novas camadas — o conflito não é só físico, mas simbólico, cultural, até existencial.
Os personagens precisam lutar contra o apagamento literal de suas identidades, territórios e histórias. E isso, como premissa, é absolutamente genial. Jemisin mistura mitologia urbana com crítica à gentrificação, ao racismo estrutural, à homogeneidade cultural imposta por estruturas de poder. E tudo isso embutido numa fantasia vibrante, onde cidades sentem, lutam, se apaixonam e sangram.
Personagens
Manhattan (Manny)Vamos começar logo com o meu xodó: Manhattan. Ele segue sendo o personagem mais magnético, elegante, levemente arrogante e perfeitamente encantador da duologia. A forma como ele representa o espírito da ilha — rico em contraste, cheio de camadas, histórico e moderno ao mesmo tempo — é incrível.
Em Nós Fazemos o Mundo, Manny continua sendo a voz da lógica e da estratégia, mas também se mostra mais vulnerável. E isso me pegou de jeito. 💔 Ele é o tipo de personagem que, mesmo em momentos menores, rouba a cena com charme e presença. Ter mais dele? Teria sido um sonho.
Brooklyn, Bronca, Padmini, Neek, VenezaOs demais avatares continuam trazendo diversidade, poder e humanidade. Cada um representa um bairro, sim, mas também uma vivência específica: musical, imigrante, acadêmica, rebelde, visionária.
Bronca, a velha arte-resistência de The Bronx, ainda é a espinha dorsal da história — firme, teimosa, essencial. Padmini (Queens) e Veneza (Staten Island) trazem contrapesos importantes: raciocínio, compaixão, conflito interno. Neek (Brooklyn) é a vibe hip-hop e política viva.
Mas, de novo... muito personagem incrível, pouco tempo para todos brilharem. Em vários momentos senti que eles mereciam capítulos próprios, mais espaço, mais desenvolvimento emocional.
Entidade InimigaA antagonista, conhecida como “Ela”, permanece uma figura abstrata e complexa — e isso é algo que admiro. Jemisin não escreve vilões fáceis. O mal aqui não é uma pessoa má, mas uma ideia destrutiva, um parasita que quer padronizar o mundo até apagar tudo que é múltiplo, diverso, difícil de definir.
Essa entidade representa forças reais: colonialismo, apagamento cultural, racismo disfarçado de progresso. É brilhante em teoria... mas na prática, essa ameaça se resolve de forma acelerada, perdendo parte do impacto que teve no primeiro volume.
O estilo da Jemisin continua sendo ousado, poético, e afiado como uma lâmina de rua. Ela mistura narração em terceira pessoa com discursos diretos, quebra a quarta parede, incorpora linguagens diversas e faz com que você sinta o ritmo de Nova York pulsando em cada página.
É uma escrita que dança com a cidade — rápida, cheia de batida, cheia de voz. Quando Jemisin acerta, é pura arte. Você lê e pensa: ninguém mais escreveria isso desse jeito.
Mas justamente por ter essa linguagem tão viva, o ritmo acelerado do enredo choca. Faltou espaço pra que a escrita brilhante brilhasse mais — houve momentos em que parecia que a história queria correr logo pra resolver a batalha, quando eu só queria ficar mais tempo ali.
Nós Fazemos o Mundo continua essa discussão lindamente — com metáforas urbanas sobre resistência, pertencimento e reexistência. A cidade aqui é corpo, é alma, é bandeira de luta. A fantasia serve como lente para enxergar o que já está ao nosso redor: a cidade como ser vivo que respira história, cultura e dor.
Mesmo com a corrida final, o livro ainda emociona e provoca. Fala sobre resistir sem se tornar aquilo que te destruiu. Fala sobre reconstrução. Sobre união que nasce da diversidade. E sobre fazer o mundo — mesmo que ele tente se desfazer o tempo todo.
Nós Fazemos o Mundo é uma boa continuação, mas não tão poderosa quanto o primeiro livro. O universo criado por N.K. Jemisin continua sendo um dos mais criativos e necessários que já li na fantasia contemporânea. Só que aqui, a execução não alcança tudo o que prometeu.
Se você amou o primeiro livro, vai querer sim ler este — só vá com o coração preparado pra uma despedida rápida demais de personagens que mereciam ficar mais.
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